A "atecnia" alegada em defesa de Hélio Parente não se sustenta, porque não aconteceu uma falha técnica na prestação de contas. Parente foi condenado porque simplesmente não prestou contas da administração financeira durante sua passagem de seis meses na Procuradoria Geral do Município de Aquiraz, no período de 16 de março a 30 de setembro de 2004.
O fato rendeu uma Tomada de Contas de Gestão, processo protocolado no TCM no dia 30 de abril em 2010. Na conclusão do auditor David Santos Matos, ao deixar de prestar contas quando era obrigado a fazê-la, Hélio Parente cometeu uma improbidade administrativa, segundo o art. 11, inciso VI, da Lei Federal no. 8.429, de 02 de junho de 1992. "A prestação de contas é um dos aspectos principais porque se manifesta a probidade administrativa", destacou Matos no parecer de sua auditoria.
O processo contra Hélio Parente, nº 10969/10, foi julgado na 1ª Câmara do TCM, durante a sessão de 19 de julho de 2011. Nas nas razões do voto do relator do caso, conselheiro José Marcelo Feitosa, a gestão de Hélio Parente foi considerada irregular e culpada pelo não envio da prestação de contas, "contrariando o art. 2º da Instrução Normativa nº 01/2001 do TCM".
Queira ou não, um gestor público é obrigado a prestar contas dos recursos públicos que ordenou pagamento. Além de irregularidade das irregularidade, deixar de apresentar a prestação de contas é a maior falta de respeito perante um tribunal de contas. Por isso, de acordo com o Decreto-lei nº 201/67, conforme jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, a não prestação de contas da administração financeira é considerada crime de responsabilidade.
Hélio Parente deixou de cumprir uma obrigação legal com o TCM quando era gestor, não tem agora como cobrar o mesmo dos gestores como conselheiro do TCM. Sua irregularidade, além de agredir a razão da existência do tribunal de contas, feriu o princípio da "reputação ilibada", exigência necessária para um conselheiro de contas.
A descoberta da condenação de Hélio Parente repercutiu negativamente na Assembléia Legislativa. Os deputados estaduais Fernando Hugo (PSDB-CE), Roberto Mesquita (PV-CE) e Heitor Férrer (PDT-CE) cobraram explicações sobre os dados omitidos no requerimento para a sabatina na Comissão de Constituição, Justiça e Redação, CCJ.
Coube ao presidente da Assembléia, Roberto Cláudio Frota Bezerra (PSB-CE), a mais esfarrapada das desculpas. Roberto Cláudio disse que Hélio Parente não sabia do processo e que apenas soube do andamento da condenação depois do nome ser aprovado pela CCJ. Informação de absoluta má fé, pois além de atuar como advogado no tribunal, o nome de Hélio Parente foi notificado na dívida ativa de Aquiraz, no dia 1º de fevereiro de 2012, conforme ofício endereçado ao TCM pela prefeitura municipal.
Ao tentar reforçar o sofisma da "atecnia", Roberto Cláudio ainda mentiu. Falou aos jornalistas cearenses, "Há parecer da auditoria aprovando o teor e o mérito. O que faltou foi a apresentação de um documento. Não há nenhum ato de improbidade”. O único parecer existente no processo é do auditor David Santos Matos, que declarou justamente o contrário do que disse Roberto Cláudio.
A auditoria foi bastante clara na recomendação de punir Hélio Parente pela grave irregularidade, enquadrando o erro em "improbidade administrativa". Esta auditoria foi também referendada pelo procurador Júlio Cesar Rola Saraiva, do Ministério Público de Contas, no dia 8 de junho de 2010, que também considerou a não prestação de contas "descumprimento grave" e ainda recomendou aplicação de "multa severa" contra Hélio Parente.
Como se fosse possível negar a realidade, Roberto Cláudio fez uma afirmação esquizofrênica, “Em 30 anos de serviço público, não houve nenhuma denúncia de imoralidade contra Hélio Parente”, como se não bastassem uma condenação pelo TCM, pelo Ministério Público de Contas, além de outras citações.
Depois de uma mentira e de uma insanidade, nervoso e irritado, Roberto Cláudio tentou encerrar o assunto e empurrou com a barriga, encaminhando a cobrança dos deputados à CCJ – que aprovou a indicação em prazo recorde, sem qualquer levantamento de informações consistentes sobre a ficha do indicado.
O nervosismo e a irritação de Roberto Cláudio têm explicação no artigo 321 do Regimento Interno da Assembléia. Para entronizar Hélio Parente no TCM, o regimento interno foi violentamente rasgado. Existiam etapas a serem cumpridas que simplesmente não foram obedecidas. Tamanha ilegalidade, enquadra todos em crime de responsabilidade.
O presidente da Assembléia cearense deveria ter lido em plenário o requerimento com o currículo do candidato a vaga do TCM, subscrito por 1/5 dos deputados, depois do requerimento ser protocolado no prazo de cinco dias úteis. Só assim o indicado poderia ir à sabatina. O presidente não obedeceu o prazo protocolar de cinco dias, além de omitir a condenação de Hélio Parente no requerimento. Assim, Hélio Parente virou conselheiro do TCM quebrando um recorde nacional, menos de 24 horas.
A nomeação de um conselheiro condenado, condenou também a própria Assembléia Legislativa, sobretudo, colocou em maus lençóis o presidente. Ao atropelar prazos e omitir dados do indicado no requerimento da indicação, Roberto Cláudio cassou da sociedade o direito de controlar quem controla os órgãos de controle externo das contas públicas.
Ninguém tem acesso ao processo de indicação de Hélio Parente. O processo está sendo guardado a sete chaves pelo departamento legislativo, mais um absurdo.
O vício de triangular operações jurídicas envolvendo escritórios de advocacia com procuradorias e demais cargos no Poder Judiciário é reconhecidamente ilegal. Agride o princípio da impessoalidade dos julgamentos, corrompe o fundamento do Estado democrático de direito. O assunto conspira contra o interesse nacional e está na pauta do Conselho Nacional de Justiça.
Por muito menos, o Tribunal de Justiça do Espirito Santo anulou em 13 de fevereiro de 2012, a nomeação de Marcus Madureira para o Tribunal de Contas do Espírito Santo. A decisão surgiu de uma Ação Popular, movida pelo ex-governador capixaba Max Mauro. A anulação foi baseada na exigência constitucional de "conduta ilibada" para o cargo de conselheiro. Madureira perdeu o cargo devido uma escuta telefônica onde cobrava propinas quando diretor do departamento de estradas do Espírito Santo. Além da perda do cargo, Madureira foi condenado a pagar R$ 10 mil de honorários aos advogados do caso.
A mesma ação pode ser movida contra a nomeação de Hélio Parente. Dez dias depois da derrubada do conselheiro condenado no Espirito Santo, o Ministério Público cearense abriu processo de investigação no mesmo sentido.
O pedido de investigação foi apresentado ao procurador geral de Justiça, Ricardo Machado, recém empossado, pelos promotores de Justiça José Wilson Sales Júnior e Eulério Soares Cavalcante Júnior. O procurador-chefe do Ministério Público estadual garantiu que o caso Hélio Parente será investigado.
Hélio Parente também respondeu a um processo penal no Tribunal Regional Federal de São Paulo. Foi acusado pela procuradora da República Rita de Fátima Fonseca de cometer o crime de tráfico de influência contra a administração pública em geral, art. 332.
A ação penal correu entre os anos de 2003 a 2008 na 3ª Vara, Capital-Criminal na TRF 3ª região. Segundo consta no site da TRF, Hélio Parente foi absolvido do caso. Seu advogado de defesa foi Paulo Napoleão Quezado, um dos advogados mais caros da região Norte/Nordeste.
Hélio Parente ainda é citado pelo promotor Igor Pinheiro, do Ministério Público do Estado do Ceará, como envolvido na quadrilha que fraudava licitações para locação de veículos em Tianguá, Santana do Acaraú e Ubajara. O escândalo ficou conhecido como Operação Caça-Fantasmas com a prisão dos envolvidos pela polícia civil. No esquema, as prefeituras contratavam veículos de empresas falsas, que sequer tinham carros em seu nome. As fraudes chegaram a R$ 2,5 milhões em 2010 e 2011, de acordo com o promotor.
No decorrer desta reportagem, com a evolução e o aprofundamento das investigações, muitos fatos novos aconteceram com claros sinais da existência de uma operação para apagar rastros, ou qualquer outra pista que comprometa o esquema que tem Fernando Oliveira e Hélio Parente como os principais pivores.
Além do estranhíssimo vai-e-vem de José Leite Jucá Filho entre PGE-TCE, Aline Saldanha, por exemplo, foi transferida do TCE para o TCM, depois de ser remanejada da Escola de Contas para a procuradoria jurídica dentro do tribunal. O site do escritório Vasconcelos & Jucá foi retirado do ar para reformulações, depois de permanecer on-line durante todo o período de nomeações, exonerações e indicações de Leite Jucá no TCE e de Hélio Parente no TCM.
Nos últimos dias, depois que o Ministério Público estadual aceitou o pedido de investigação sobre a indicação recordista de Parente para o TCM, aumentaram as suspeitas que a situação de Hélio era insustentável. No twitter, o advogado @andreacbarroso comentou: "Se posse de Hélio Parente como Conselheiro do TCM/CE for revista, conforme se antecipa, será um dos maiores constrangimentos já vistos no Estado.”
À propósito, para a vaga de José Leite Jucá Filho na procuradoria jurídica do TCE foi nomeado Paulo Hiram Studart Gurgel Mendes, que ocupava o cargo de procurador-geral de Consultoria Administrativa e Contencioso Geral na Procuradoria Geral do Estado. A fábula da raposa no galinheiro virou regra no Ceará.